Reportagem Especial

Swing: A religião de Euríale

Foto: Cláudia Rogge

Foto: Cláudia Rogge

Em uma das inúmeras travessas da Av. Ipiranga, no bairro Santana, em Porto Alegre, na altura do número 25 vê-se um pequeno portão entreaberto. A abertura dá visão a um pequeno corredor escuro que leva ao templo da luxúria e de todos os prazeres da carne, onde o espírito de Euríale, a górgona, irmã de Medusa, deusa da perversão sexual exulta e cede a benção aos seus fiéis.

Ao adentrar ao local, em um primeiro momento, o acanhado salão com sofás e mesas distribuídas ao redor das paredes e bar na entrada, com exceção de um disputado pole dance e um box de vidro com chuveiro, não denotam a inconvencionalidade do lugar, porém basta que os fiéis seguidores da “religião” transpassem as portas para que o cheiro inebriante da lascívia inunde o local onde tudo é permitido, mas nada é obrigatório.

A cena do que os adeptos chamam de “religião” e declaram ser viciante, poderia bem ser a cena de uma pornochanchada dos anos oitenta, ou uma peça teatral baseada nos bacanais gregos ao deus do vinho, Baco, no entanto é a vida real de uma casa de “swing” na capital de todos os gaúchos.

Ao final da pista uma parede que esconde os banheiros, também não mostra em um primeiro momento o corredor, ladeado de portas que levam a simples e pequenos quartos com camas de casais. Para os não convertidos, muitas cenas chamam a atenção quando os olhos percorrem o salão.

Uma farta e volumosa morena, cavalga de forma voraz o falo de um jovem rapaz, seus gemidos e sussurros de prazer, misturam-se as conversas paralelas ao redor e o tilintar de copos de whisky e cerveja dos fiéis que acompanham a cena. Há 10 metros dali, o marido da voluptuosa morena ataca as pick-ups e como os demais acompanha a cena, onde sua amada esposa delira de prazer com outro homem.

A voraz morena se apresenta como Morena, autônoma, 35 anos e o “DJ”, é Alemão, pintor de casas, 37 anos, ambos, são um dos casais sócios da casa de “swing” localizada na Av. Gastão Rhodes,  e casados há 19 anos. “ Ver ela sentindo prazer me dá um sentimento de satisfação”, destaca Alemão.

A origem

bacanalNão é difícil encontrar na história registros de sociedades que tenham defendido um estilo de vida com múltiplos parceiros sexuais. A realeza e a nobreza em um leque variado de culturas tiveram consortes e concubinas. Na Roma antiga a aceitação as orgias, justificadas por meio de celebrações ritualísticas, em comemoração as colheitas e/ou a fertilidade da terra, eram notórias e entusiásticas.

Na Grécia Antiga acontecia algo muito semelhante. Quem já ouviu o termo “bacanal”, talvez não saiba, mas o termo teve origem nas orgias realizadas em homenagem a Baco, o deus do vinho, em agradecimento pela colheita.

Há ainda nos registros antropológicos da humanidade culturas onde a troca de casais é uma estratégia de sobrevivência, como no caso dos nativos do Alasca, os Iñupiat, por viverem em um território inóspito precisam estender laços para garantir auxílio nos tempos difíceis, com isso a troca de casais se tornou natural e cultural.

A prática moderna, o swing com as características atuais tem seu início de forma discreta e inexata, na obra “Vidas”, de 1928, do autor H.O. Jones. Há registros da palavra “Swing” como definição para troca de elementos entre casais, o que então comprova que a prática já era conhecida nos anos 20.

Nos Estados Unidos, na década de 50, a “wife Swapping”, foi difundida nas “festa das chaves”, onde os maridos depositavam as chaves dos carros em um recipiente localizado no centro de uma sala e as mulheres sorteavam uma chave aleatória para passar a noite com o dono da chave sorteada.

No Brasil o primeiro registro de uma casa de swing remonta ao bairro Alto de Pinheiros, em São Paulo (SP), na década de 60. Atualmente a mais antiga em funcionamento é a Marrakesh, funcionando há 28 anos, no bairro de Moema, São Paulo (SP).

A verdade é que o Swing, ou troca de casais é uma realidade da sociedade, com milhões de adeptos em todo o mundo. Na internet há milhares se sites e comunidades destinadas a isso e inclusive uma rede social, a d4swing.com.br. Isso torna o assunto incontornável. Se audácia é falar nele, absurdo seria ignorá-lo.

Existem vários tabus em relação à prática do “swing”, automaticamente a troca de casais é associada à orgia e à falta de respeito plena e total. No entanto, ao mergulhar nesse mundo o que se pode notar é que a imagem no mínimo é equivocada, normalmente os adeptos são pessoas casadas ou em relacionamentos duradouros, e sua grande maioria com vida financeira e profissional estáveis, filhos e até netos. E há regras básicas de etiqueta entre os adeptos, além das regras de cada casal.

Swing também é uma arma contra a baixa estima

Além de apimentar a relação, para as frequentadoras uma casa de swing pode se mostrar uma excelente arma contra a depressão e baixa estima. Como revela “Cuca”, 39 anos, divorciada há 4 e swinger desde fevereiro de 2014.

A loira de olhos verdes cristalinos, mãe de dois filhos, estudante de gestão comercial, destaca com um sorriso no rosto que desde seu primeiro dia como frequentadora da “religião”, foi muito bem acolhida. Ela ainda lembra que após a separação de um casamento de 17 anos, tendo casado virgem e sendo mulher de apenas um homem, acreditou que não despertaria mais o interesse masculino. “Quando cheguei aqui eu pesava 103 quilos e mesmo assim tinha homens interessados em mim”, relata.

IMG-20141109-WA0014Outra cena que chama atenção é uma loira, de seios fartos metidos em um minúsculo espartilho vermelho de enorme decote, cabelos louros e crespos, sorriso fácil.

A pequena notável é Safadinha, 30 anos, assistente financeiro,  as meias, presas a calcinha fio dental pela cinta liga, envolvem apenas uma das pernas, a outra ela perdeu em um acidente de moto em 2008, apoiada em muletas ela circula sorridente e a vontade acompanhada do marido, Sr. Safadinho de 28 anos.

Safadinha revela que nunca sofreu preconceito por sua deficiência em nenhuma das casas de “swing” que frequentou, destaca ainda que as festas de Swing são bem diferentes das convencionais não apenas no que envolve o aspecto sexual do ambiente.“Nas casas ditas convencionais as mulheres não respeitam uma a outra, os homens acham que podem chegar e colocar a mão em qualquer uma. No Swing isso não existe, tudo que é feito aqui só é feito com a tua permissão”.

A loira de sorriso fácil ainda revela que ao contrário de Cuca nunca teve problemas de baixa estima, mas que se sente mais desejada. “Nunca tive problemas com minha estima, me acho muito gostosa (risos), mas em uma casa de swing, as pessoas fazem tu se sentir desejada”, frisa.

Apimenta, mas nem tudo são rosas

Os casais entrevistados, em sua grande maioria afirmam que a prática do swing tem sido o principal apimentador das suas relações a dois, afirma a Sra. K, 40 anos, secretária e ao lado do marido, Sr. K, 44 anos, pintor de casas, sócia da casa. Junto com o casal Alemão e Morena.

“Depois de 19 anos de casados, o casamento caiu na rotina, transávamos uma ou duas vezes por semana, depois que viramos swinger’s há 4 anos atrás, chegamos a transar três vezes por dia”, relata aos risos. Sr. K ainda enfatiza que embora o swing dê um up na relação, não salva casamento. “Se o casal não for bem resolvido, a situação tende a piorar com o swing e o melhorar é separar”, destaca.

Nos 6 anos de existência da casa histórias no mínimo curiosas já aconteceram, comenta Morena, como um casal de cerca de 80 anos que supostamente por engano entraram no local, gostaram do que viram no ambiente e ficaram, ou ainda um casal que frequenta a casa na sexta e no sábado seu filho vem com a nora, como que numa tradição de família passada de pai para filho.

Em outras situações relatadas por uma swinger de 32 anos, que há 2 anos frequenta casas de swing em Porto Alegre, recepcionista, separada desde 2010 conhecida nos clubes e nas redes do gênero por D’vassinha denotam que nem tudo são rosas. Ela conta que em uma certa casa do gênero uma mulher acabou defecando durante a relação sexual com dois homens. E em outra um rapaz quando tirou a roupa de sua parceira notou que ela carregava uma bolsa de colostomia.

O risco de DST’s

O risco de DST’s (Doenças Sexualmente Transmissíveis)  com a prática, mostra-se enorme, segundo um estudo holandês publicado na revista científica “British Medical Journal” . A pesquisa mostra que praticantes de “swing”, especialmente os que têm mais de 45 anos, apresentam índices mais altos de DSTs do que prostitutas.

O trabalho, feito pela pesquisadora Anne-Marie Niekamp, da Universidade de Maastricht, analisou pacientes que buscaram tratamento para DST  em três centros de saúde na Holanda. Ao todo, foram realizadas 9 mil consultas e um em cada nove pacientes era praticante de “swing”, com idade média de 43 anos.

O estudo mostrou que os índices de clamídia e gonorreia são de aproximadamente 10% entre heterossexuais, 14% entre homens gays e abaixo de 5% entre prostitutas do sexo feminino. Já entre os “swingers”, a taxa é de 10,4%.

O que foi exposto pela pesquisa holandesa se confirma numa rápida conversa com D’vassinha. Ela revela que já transou simultaneamente com seis homens e afirma que em todas as relações foram utilizados preservativos, porém ao ser questionada sobre se o sexo oral foi feito com camisinha ela afirma que não.

O risco de contrair alguma DST durante o sexo oral é grande segundo a cientista americana Debby Herbenick, presidente da Associação Americana de Sexualidade Educadores, Conselheiros e terapeutas (AASECT) “Quase tudo o que se pode transmitir através da penetração também pode ser transmitido pelo sexo oral. Herpes, clamídia e gonorreia, por exemplo. O HIV também pode ser transmitido por sexo oral. No entanto, esta é uma forma de baixo risco de transmissão de HIV” , destaca.

Além do sexo oral, alguns swinger’s  que não quiseram ser identificados admitiram não utilizar preservativos em algumas relações. Mesmo com o uso do preservativo há o risco de acidentes, com a camisinha estourar ou cair e estar exposto ao histórico sexual de várias pessoas diferentes e na maiorias das vezes desconhecidos aumenta esse risco.

Embora com todos os prazeres que o “swing” oferece, segundo declaram os adeptos. Ele também oferece os riscos, já comprovados.

Apesar de divertirem-se no meio, algumas solteiras afirmam que não teriam relacionamento com homens do meio. Sy, 26 anos, auxiliar de RH, olhos anilados, sorriso fácil e fã de “booty selfies” , é uma delas. “Eu nunca namorei, casei direto, depois separei. Para namorar, teria que ser alguém de fora, não divido o que é meu (risos), relata a loira “pitoka” como gosta de ser chamada.

O desejo que se opõe as morais e bons costumes da sociedade é o que move casais que parecem não ter pudores e nem limites para o prazer. Como Nena, 35 anos, casal Lobo e Chapeuzinho. O casal que registra fotograficamente quase todos os encontros a dois, três, quatro ou mais pessoas destaca que tem sim alguns temores como o medo de doenças, mas que o prazer recompensa. “Meu prazer é me sentir desejada. Pegar outra mulher, fazer o diferente”, destaca.

Os espaços para o prazer

O espaço onde ocorrem as relações sexuais podem variar em uma casa de swing, embora camão e darkroom sejam tradicionais na grande maioria dos clubes. Abaixo os mais comuns encontrados:

Camão ou tatame: é uma cama grande onde vários casais praticam sexo simultaneamente. È comum que ao redor da cama vários casais assistam e estimulem os demais participantes

Darkroom : são ambientes, como o nome sugere, sem iluminação, completamente escuro. Nele há poltronas e/ou sofás nos quais os casais trocam carícias ou mesmo relacionam-se sexualmente. O estímulo desejado é mais auditivo que visual, e permite grande privacidade

Aquário: são ambientes com paredes de vidro nos quais os casais se relacionam. Do lado de fora, pelo vidro, outros assistem

Confessionário: Ambientes com camas ou poltronas individuais, separadas do ambiente externo por treliça de madeira que permitem a quem está de fora assistir a relação.

Labirinto: local com pouca iluminação, estruturado em formato de labirinto, com o objetivo de encontrar a saída, pelo caminhos os casais trocam carícias e encontram pequenas surpresas, como confessionários, espalhados pelo ambiente.

Cadeira erótica: cadeira projetada especialmente para facilitar grande número de posições sexuais

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